Quinta-feira, 23 de Outubro de 2025
icon-weather
DÓLAR R$ 5,37 | EURO R$ 6,21

23 de Outubro de2025


Área Restrita

DESTAQUES Quinta-feira, 23 de Outubro de 2025, 16:09 - A | A

Quinta-feira, 23 de Outubro de 2025, 16h:09 - A | A

Dias após se encontrar com Milei

Trump diz que a ‘Argentina está morrendo’; ele está certo?

Especialistas comentam que fala do presidente americano foi “excessiva” e apontam melhoras na economia do país

Administração

 

Com uma mistura de tragédia e fatalismo, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, descreveu a Argentina como um país que está morrendo: disse que “não tem dinheiro, não tem nada, e está lutando muito para sobreviver”.

Como se fosse um fenômeno distante e jamais experimentado, o presidente americano perguntou a uma jornalista durante um voo no Air Force One: “Você sabe o que isso significa?” E, para que ficasse ainda mais claro, soltou uma sentença sobre a Argentina que abriu a polêmica: “eles estão morrendo, está claro? Eles estão morrendo”.

 

Com declarações desse teor, Trump parece estar tentando também acalmar sua própria “tempestade interna”, já que não são poucas as vozes que recriminam seu favoritismo pela Argentina, enquanto os produtores agropecuários de seu país são prejudicados e seu Governo está fechado há três semanas, sem conseguir um acordo no Congresso, o que faz com que muitos funcionários não estejam recebendo seus salários. Nesse contexto, ele justifica sua ajuda como se fosse um assunto de vida ou morte.

O analista internacional Robert Valencia assegura que o descontentamento com o acordo se baseia no fato de que “muitos acreditam que a assistência que Trump dá a Milei não tem um valor de retorno, ou seja, que os Estados Unidos não se beneficiam”. E ele assinala que as críticas a Trump já nascem do próprio Partido Republicano, porque ele fez campanha apoiado em seu já conhecido lema “America first” (América primeiro), mas estas medidas parecem ir contra o interesse de seus próprios eleitores fazendeiros. 

Mas afinal, a Argentina está morrendo? A primeira resposta nasce da história. Os países se separam, se fundem, fazem guerra, assinam a paz, têm crises de diferentes tamanhos, mas não morrem. E a Argentina não é a exceção.

É assim que vê, por exemplo, Carlos Fara, analista político: “a declaração de Trump foi excessiva. A Argentina está em uma situação econômica muito complicada, mas não é que estejamos morrendo. Sim, há muita preocupação com o poder aquisitivo dos salários, há incerteza quanto ao emprego e a economia está paralisada. Por isso há mais pessimismo que otimismo e mais desaprovação que aprovação da gestão presidencial”. 

O jornalista financeiro do periódico argentino El Cronista, Julián Yosotovich, observa o mesmo: “Não creio que a Argentina esteja morrendo. De fato, me parece que está melhor hoje do que estava no passado”.

A Argentina não está morrendo, mas atravessa uma crise — mais uma — do setor externo. O que isso significa? Que o ritmo de sua geração genuína de dólares é inferior ao da exteriorização dessa moeda.

 
 

Para dizer de forma mais simples, na Argentina hoje entram menos dólares do que saem, produto do que muitos analistas concordam ser um dólar atrasado, motivo que alimenta o apetite do turismo emissivo e da importação, duas das principais torneiras por onde a moeda americana flui para o mundo.

Por isso ocorreu a assistência do Tesouro dos Estados Unidos e, talvez, também por isso que estes sentimentos invadam Trump quando pensa na realidade do país de seu aliado, Javier Milei.

É assim que explica também Javier Marengo, Sócio e Economista Chefe da BlackTORO Global Wealth Management: “Se a Argentina está lutando por sua vida é por uma questão de confiança e a chave é saber como se resolve esse cenário de desconfiança. E o resgate do governo americano de algum modo busca isso”.

A insistência nas dificuldades do setor externo se deve ao fato de que outros registros apontam para uma recuperação macroeconômica: a Argentina é hoje um país com superávit fiscal e comercial, segundo os últimos dados oficiais, e com uma inflação com tendência a se estabilizar, embora ainda em percentuais altos.

Tudo isso sem desconsiderar que o quadro social continua a apresentar desafios crescentes, para além da frieza dos números. A Argentina não está morrendo e atravessou crises piores do que esta.

Em dezembro de 2001, o país explodiu após dez anos de paridade cambial de um peso por um dólar, o governo do então presidente, Fernando de la Rúa, caiu, houve cinco presidentes em uma semana, uma confiscação de depósitos bancários e o tecido social se fraturou com uma explosão da pobreza.

Em números, durante aquela crise histórica a taxa de desocupação atingiu 19,7 % em 2002, enquanto o último relatório do mercado de trabalho (segundo trimestre de 2025), publicado pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INDEC), confirmou que 7,6 % dos argentinos estão desocupados.

Na saída daquele trágico dezembro de 2001, a taxa de pobreza alcançou um recorde de 66 % durante os primeiros meses de 2002, enquanto o último registro deste ano aponta para 31,6 % de argentinos abaixo desse limiar, pelo menos até o primeiro semestre deste ano.

A desigualdade social chegou em 2002 a 0,53 no coeficiente de Gini, um índice em que 1 é uma perfeita desigualdade e 0 uma perfeita igualdade, enquanto hoje se situa em 0,43 durante o primeiro trimestre de 2025.

A inflação acumulada de 2002 foi de 41 %, enquanto em outubro de 2025, esse mesmo índice acumulado alcança 31,8 %. Por outro lado, a Argentina terminou 2001 com um déficit fiscal da ordem de 5,3 % do produto e, em setembro, o governo de Javier Milei informou que o setor público alcançou um superávit primário de 1,3 %.

Tudo isso sem ignorar que a Argentina parece se aproximar de uma nova fase recessiva de seu ciclo econômico, com tensões cambiais, fiscais e sociais que se acentuam durante o ano eleitoral. Em um país que muitas vezes mataram, mas que nunca morreu.

Comente esta notícia

Rua Rondonópolis - Centro - 91 - Primavera do Leste - MT

(66) 3498-1615

[email protected]