A Justiça de Mato Grosso assegurou o direito de P. A. P. M., 45 anos, moradora da zona rural de Confresa (1.057 km de Cuiabá), de realizar a cirurgia de redesignação sexual pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O procedimento, avaliado em R$ 69 mil, será realizado no Hospital de Base de São José do Rio Preto (SP) no dia 30 de outubro, após ação movida pela Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT).
O processo foi ajuizado em março deste ano e representa um marco inédito na garantia da cirurgia pelo SUS sob responsabilidade do estado. A ação foi conduzida pelo defensor da 1ª Defensoria de Porto Alegre do Norte, Geraldo Vendramini, e pela equipe formada por Lara Linhares, Daniela Lago e Daniella Borges.
Na petição inicial, Vendramini argumentou que “a cirurgia pleiteada transcende a mera questão jurídica, alcançando o cerne da saúde pública em sua acepção mais estrita”. Ele destacou que a negativa do acesso afronta o princípio da dignidade da pessoa humana.
“Quando recebi esse caso, sabia que estava diante de algo diferente do cotidiano habitual da Defensoria. Não era apenas mais um processo, era a oportunidade de transformar princípios constitucionais em realidade palpável. Hoje, observando o resultado alcançado, vejo como uma atuação inicialmente incomum se revelou um instrumento poderoso de efetivação de direitos fundamentais”, declarou o defensor.
O processo contou com relatório da endocrinologista Cristianne Serafim, responsável pelo acompanhamento de P., que recomendou a realização da cirurgia fora do estado, já que Mato Grosso não possui serviços habilitados para o procedimento. Segundo a ação, “a paciente apresenta quadro de disforia de gênero, encontrando-se sob acompanhamento da equipe de endocrinologia há mais de dois anos”.
A primeira decisão favorável foi concedida em 20 de março de 2025 pela juíza Amini Haddad Campos, do Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública, determinando que o Estado providenciasse a cirurgia em 30 dias. Como a liminar não foi cumprida, a Defensoria pediu a majoração da multa e o caso foi encaminhado ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) da Saúde Pública.
O CEJUSC solicitou orçamentos a hospitais e, em junho, a magistrada determinou que a cirurgia fosse realizada pelo Hospital de Base de São José do Rio Preto, com custos pagos pelo Estado e transporte garantido pelo município de Confresa.
“No início de setembro, o Hospital de Base comunicou o agendamento do procedimento para 30 de outubro de 2025. Para nós, da Defensoria Pública, a decisão representa a concretização de uma política pública inclusiva”, afirmou Vendramini. Ele avaliou que a medida é histórica por consolidar o reconhecimento judicial do direito de uma mulher trans à cirurgia e reforçar a responsabilidade conjunta de Estado e Município no custeio.