Há cerca de dois anos, os preços do cacau começaram a disparar na bolsa de Nova York, o que pôs muito mais holofotes do mercado global sobre a cultura. A valorização da commodity aumentou a remuneração dos produtores, mas, no Brasil, problemas de baixa produtividade têm freado um pouco a empolgação na cadeia.
Hoje, o rendimento médio do cacau brasileiro é de 350 quilos por hectare, segundo a CocoaAction Brasil, uma iniciativa público-privada que trabalha para desenvolver a cultura e reforçar as iniciativas sustentáveis da cadeia. A produtividade “ideal”, no entanto, é de 1,5 mil quilos por hectare, de acordo com um estudo que o Instituto Arapyaú desenvolveu em 2022, em parceria com o CocoaAction e a WRI Brasil.
O estudo, que investigou a viabilidade econômica da produção de cacau no país, usou como parâmetro de produção uma família de quatro pessoas que possui até cinco hectares — um perfil que espelha o da maior parte da produção nacional, que ocorre principalmente na agricultura familiar. Segundo o estudo, a produção de cacau é economicamente viável para esse perfil de negócio quando se produz 1,5 mil quilos por hectare.
Para Vitor Stella, coordenador técnico do CocoaAction Brasil, é possível diminuir a lacuna entre a produtividade efetiva, de 350 quilos por hectare, e a ideal, de 1,5 mil quilos, com manejo agronômico básico. “Análise e condicionamento de solo com calcário, tratos culturais básicos, boa poda, manejo da luminosidade, consórcios agroflorestais”, relata.
Luciano Ramos, um pequeno produtor de Ilhéus, no sul da Bahia, confia na cadeia do cacau como poucos. “Eu coloco dinheiro próprio porque acredito na viabilidade da cultura. Se você fizer uma análise técnica, o cacau sempre será um ótimo negócio, seja em áreas tradicionais ou não”, diz.
Ramos produz cacau em 15 hectares em sistema cabruca — em que os cacaueiros ficam sob a sombra de árvores nativas da Mata Atlântica — e obtém entre 1,5 mil e 2 mil quilos por hectare. “Mas dá para melhorar”, afirma. Na década de 1970, lembra, era comum produzir 1,5 quilos por hectare. “Por que hoje não seria possível produzir 2 mil por hectare na cabruca?”, questiona.
Nos anos 1980, o Brasil chegou a colher mais de 400 mil toneladas de cacau por ano, mas a produção entrou em forte declínio no início da década seguinte, com a disseminação da vassoura-de-bruxa. A doença, que chegou ao sul da Bahia em 1989, até hoje é responsável por perdas relevantes na cultura.
“Na época, nossa produtividade caiu para um quarto do que tínhamos. O Brasil já produziu 400 mil toneladas por safra, e agora produz pouco menos de 200 mil toneladas”, relata João Tavares, que produz cacau fino em Uruçuca (BA).
A Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), que reúne as três principais moageiras do mundo — Barry Callebaut, Cargill e Olam —, recebe 95% das amêndoas de cacau que o Brasil produz. Segundo Anna Paula Losi, presidente da AIPC, os 5% restantes destinaram-se à exportação, à produção de chocolate fino e à Gencau, processadora nacional que não integra a entidade.
Em 2024, a AIPC registrou o processamento de 179 mil toneladas. Com isso, estima-se que a produção total no ano passado tenha beirado as 190 mil toneladas.
Nos últimos dois anos, a cultura voltou a ser atrativa para muitos produtores. Em julho de 2023, o preço médio da amêndoa na bolsa de Nova York foi de US$ 3.366 por tonelada. As cotações atingiram sua máxima histórica um ano e meio depois: em 18 de dezembro de 2024, os investidores fecharam o dia negociando contratos de cacau por US$ 12.565 a tonelada. Os preços caíram desde então, e hoje estão na casa de US$ 7,5 mil, um patamar ainda elevado.
Ricardo Gomes, diretor programático do Arapyaú, estima, com base no mais recente — de 2017 — censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que existam 93 mil produtores de cacau no Brasil. Pelo menos 70% deles estão na Bahia.
A Agrícola Cantagalo, de Cláudia Sá, possui 13 fazendas no Estado, com 1,8 mil hectares de cacau na cabruca e produtividade média de 525 quilos por hectare. Para aumentar o rendimento, ela diz, é necessário renovar as áreas de cabruca, um processo complexo, já que é difícil entrar com maquinários na mata. “Temos até dinheiro para pagar, mas não tem mão de obra para isso”, afirma.
Em Medicilândia (PA), Juraci Costa cuida de seis hectares desde 2004. “Foi uma surpresa boa a alta dos preços. Está nos dando fôlego e conseguimos reinvestir na lavoura”, afirma. Ele trabalha para aumentar a produtividade, o que daria a ele segurança de cobrir os custos mesmo se os preços caírem.
Para o produtor, o lado bom da cacauicultura é a distribuição de renda para toda a família. “Minha família inteira trabalha na colheita e na quebra do cacau. É uma atividade que gera mão de obra”, diz