A imposição da sobretaxa de 50% pelos Estados Unidos ao café do Brasil — que contribuiu para os preços internacionais do grão subirem 33% em agosto — fez as exportações brasileiras ao mercado americano despencarem. Segundo dados preliminares do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), entre os dias 1 e 25 de agosto, o Brasil exportou aos 193,9 mil sacas de café aos EUA, 46,6% menos que em igual período de 2024.
Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé, afirma que a queda nos embarques deve-se não só ao tarifaço, mas também ao recuo na produção de café, em comparação a 2024. Além disso, diz, gargalos logísticos também atrapalharam.
“Em julho, as exportações foram em torno de 450 mil sacas. Comparando com este mês [agosto], houve uma queda expressiva nos embarques, com efeito da safra menor e do tarifaço”, relata Heron.
Ele diz que, apesar do tarifaço, “não há um cenário de redução do consumo” nos EUA. “O tarifaço acaba gerando aumento nos preços e quem paga a conta é o consumidor americano”, afirma.
Segundo Heron, desde o início da medida, houve adiamento de “alguns contratos pontuais”. E o impacto mais expressivo do tarifaço, avalia, deve ser visto a partir de setembro, quando os maiores volumes de embarques da safra nova começam a ocorrer.
Os embarques de café para os EUA não paralisaram completamente porque parte da safra já havia sido negociada anteriormente com contratos futuros, de acordo com o Cecafé.
Negócios antecipados
Foi o que aconteceu na Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas (Cocapec), de Franca (SP), na Alta Mogiana. Ricardo Ravagnani, gerente de negócios da Cocapec, diz que a cooperativa exporta em torno de 20% do café que recebe de produtores aos Estados Unidos e que uma parcela da safra deste ano já havia sido negociada em contratos futuros para entrega ao longo do segundo semestre.
“Quem tem contrato futuro para entrega em setembro, outubro, mantém os embarques. Nenhum comprador sinalizou que quer cancelar contratos. Do lado da demanda, a gente não sente retração. O que sentimos é que tradings e compradores do mercado à vista estão saindo um pouco do mercado e aguardando para ver se as tarifas vão mudar ou não”, afirma Ravagnani.
A Cocapec espera receber neste ano 1,2 milhão de sacas de café, acima dos 1,1 milhão de sacas de 2024. Ravagnani diz que a previsão inicial era chegar a 1,4 milhão de sacas neste ano, mas a produção será menor devido a problemas climáticos na Alta Mogiana.
Para ele, como a oferta global está ajustada à demanda e há grande dependência do mercado americano em relação ao café do Brasil, dificilmente os EUA deixarão de importar o grão brasileiro.
Queda anual
A Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé (Cooxupé) também segue embarcando café para os EUA referente a contratos fechados até julho. A partir de agosto, entretanto, não houve novos negócios. “Os importadores estão aguardando para efetuar novas compras. Esse cenário sugere que, com o impasse das tarifas, o volume exportado aos EUA neste ano diminua, quando comparado com os últimos anos, visto toda essa imprevisibilidade”, diz Luiz Fernando dos Reis, superintendente comercial da Cooxupé.
Segundo Reis, diante do balanço mundial apertado de oferta e demanda, uma boa parte do café brasileiro já foi vendida. Mas a preocupação é a médio e longo prazos. “Num cenário de oferta maior, a busca por compras dos importadores americanos será por cafés de outras origens, com custo menor que o café brasileiro”, diz.
Há ainda outra preocupação: não é fácil abrir novos mercados, porque o Brasil já exportou em 2024 para 116 países e responde por 40% da produção mundial de café. Os EUA são o principal cliente do café brasileiro e foram destino de 23% das exportações no ano passado . “Remanejar um grande volume do principal consumidor de café do mundo não é tarefa fácil. Alguns países emergentes estão aumentando o consumo, mas ainda não há condições de absorver todo o volume que iria para os EUA”, observa Reis.
Nesse cenário de incertezas, o Cecafé segue em conversas com a Associação National do Café dos Estados Unidos (NCA, na sigla em inglês) para buscar uma solução, segundo Eduardo Heron.
Ainda que haja dificuldade no relacionamento com o governo Trump, a entidade defende a negociação, e na sexta-feira, manifestou em nota, preocupação com a decisão do governo brasileiro de avançar com o processo necessário pra a aplicação da Lei de Reciprocidade Econômica contra os EUA.
Segundo o Cecafé, a medida deve prejudicar as negociações do setor com órgãos americanos nesta semana em Washington. A agenda da comitiva integrada pelo Cecafé inclui encontros com escritórios de ‘advocacy’, NCA, representantes da indústria cafeeira, Departamento de Estado, evento da Câmara de Comércio Brasil-EUA, e audiência pública sobre a taxação.