O mercado de etanol deve passar por um avanço expressivo na oferta na próxima safra (2026/27), que começa oficialmente em abril, o que deve superar o aumento da demanda e reduzir os preços, segundo analistas e executivos do setor. Esse cenário indica que deve haver uma redução das margens tanto das usinas tanto de cana-de-açúcar como das usinas de milho, que estão vivendo uma forte expansão e ganhos elevados nos últimos anos.
A pressão sobre os preços deve refletir principalmente a queda dos preços do açúcar no mercado internacional, que nos níveis atuais tende a estimular as usinas de cana a migrarem uma parte maior de sua matéria-prima para a produção de etanol, segundo Lucas Brunetti, analista do Itaú BBA, em apresentação em evento da Novonesis em São Paulo.
Recentemente, os contratos futuros do açúcar chegaram a alcançar o patamar de 15 centavos de dólar a libra-peso na bolsa de Nova York, mas já voltaram acima de 16 centavos de dólar a libra-peso. Nas contas do banco, considerando um cenário-base em que os preços do açúcar não fiquem no patamar de 15 centavos de dólar, mas que continuem pressionados, os preços do etanol hidratado tendem a cair 10% na próxima safra.
Nesta situação, o Itaú BBA estima que a produção de etanol total do Brasil pode aumentar pouco menos de 6 bilhões de litros na próxima safra, sendo 3 bilhões de litros do etanol de cana no Centro-Sul e 2 bilhões de litros do etanol de milho. Com essa oferta projetada, a produção adicional deve atender tanto o aumento de mistura do etanol anidro à gasolina, agora em 30% como atender o crescimento do consumo de combustíveis de veículos leves em geral (ciclo Otto), além de ganhar participação sobre a gasolina.
A alta capacidade instalada de produção de etanol nas usinas de cana, que hoje está "adormecida" por causa da maximização da produção de açúcar, é um ponto de atenção, na visão de Mário Stênico, head de research e trading da Inpasa. Ele evitou estimar quanto pode mudar o mix das usinas de cana, mas ressaltou que o cenário é de "cautela".
Outro fator que também deve pesar sobre os preços do etanol é o cenário para o mercado global de petróleo. Stênico afirmou que os preços do hidrocarboneto já saíram de mais de US$ 100 o barril em 2022 para uma faixa de US$ 60 a US$ 65 o barril neste ano, com tendência baixista, dado o aumento da produção pela Opep de xisto nos EUA.
Para Larissa Peres, analista do JP Morgan, o principal desafio para a indústria hoje é o preço de etanol. Ela ressaltou que os projetos de novas indústrias de etanol de milho indicam que haverá uma oferta adicional de 18,5 bilhões de litros de biocombustível até o fim da década. "Podemos ter uma sobreoferta no curto prazo. Pelas nossas contas, enxergamos uma sobreoferta de 5% a 6% em média até 2030", afirmou. E isso deve representar um aperto nas margens e nos retornos, acrescentou.
Atualmente, uma indústria média de etanol de milho pura (que processa apenas o grão) tem um retorno sobre investimento (ROIC) de 18,5%, nas contas do JP Morgan. Já uma usina de cana que destina 50% da matéria-prima para o açúcar e 50% para etanol tem um ROIC médio de 11%, enquanto uma destilaria de etanol de cana tem um ROIC de 8%, segundo o banco.
As indústrias de etanol de milho costumam ter uma rentabilidade maior do que as usinas de cana por causa do DDGS, explicou Peres. No entanto, as perspectivas para o preço do produto também não são positivas, afirmou Rafael Verruck, diretor comercial de mercado interno de DDGS da Inpasa.
"O DDG está muito correlacionado com o preço do farelo de soja, que tende a ter mais oferta com o aumento do processamento", explicou. Embora existam 14 tipos de DDGs sendo produzidos pelas usinas de etanol de milho no Brasil, cm diferentes perfis nutricionais, os preços ainda oscilam de acordo com o do farelo de soja, considerados substitutos.
Stênico defendeu que a indústria do etanol de milho precisa fomentar a demanda por etanol hidratado em mercados que hoje ainda não consomem o biocombustível, como no Norte e no Nordeste. Hoje, enquanto o etanol hidratado representa 53% do mercado de combustíveis leves no Mato Grosso, onde houve a construção de várias usinas de etanol de milho na última década, o biocombustível representa ainda apenas 3% das vendas do ciclo Otto em Maranhão.
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Neste ano, a Inpasa começou a operar uma usina de etanol de milho em Balsas, no Maranhão, mas a produção ainda é mais voltada para a atender a demanda local de etanol anidro para mistura à gasolina, segundo Stênico.
A possibilidade de ganhar facilmente mais mercados é o que dá mais segurança para o mercado, na avaliação de Thiago Milani, diretor de commodities da 3tentos. A empresa está construindo uma usina de etanol de milho em Mato Grosso, que deve começar a operar no primeiro trimestre do ano que vem. "O mais importante para nós que o aumento de consumo de etanol tem espaço", afirmou.