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Com o aquecimento global

Flor que 'guia os mortos pelo caminho de volta' enfrenta o risco de desaparecer

Chuvas intensas, secas e pragas estão devastando plantações de cempasúchil — a flor que simboliza a ligação entre vivos e mortos no México — e ameaçando uma tradição centenária que sustenta milhares de famílias mexicanas

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No coração dos canais de Xochimilco, ao sul da capital mexicana, o brilho alaranjado do cempasúchil — flor símbolo do Dia dos Mortos — começa a desbotar sob os efeitos do clima extremo.

Chuvas torrenciais, inundações e secas prolongadas estão reduzindo drasticamente a produção dessa planta, conhecida como “flor dos mortos” e elemento central dos altares que homenageiam os falecidos nos dias 1º e 2 de novembro.

Cempasúchil em plena floração no bairro de Xochimilco, na Cidade do México, sexta-feira, 17 de outubro de 2025, antes das celebrações do Dia dos Mortos. — Foto: AP/Claudia Rosel

Cempasúchil em plena floração no bairro de Xochimilco, na Cidade do México, sexta-feira, 17 de outubro de 2025, antes das celebrações do Dia dos Mortos. — Foto: AP/Claudia Rosel 

Tradição ameaçada 

Há três décadas, Lucia Ortíz cultiva o cempasúchil em um pequeno terreno herdado da família. Mas, aos 50 anos, a agricultora admite não saber por quanto tempo conseguirá sustentar essa tradição.

“Perdemos muito este ano. Houve momentos em que não tínhamos dinheiro nem para comprar fertilizante”, contou à agência Associated Press. “Com o cempasúchil, às vezes ficamos sem nada.”

As perdas não são pontuais: produtores relatam prejuízos de até 50% da safra em 2025, consequência direta do excesso de chuvas e da proliferação de pragas e doenças nas raízes. Segundo dados do governo mexicano, mais de 37 mil acres de plantações foram devastados.

Apesar das dificuldades, a prefeita da Cidade do México, Clara Brugada, afirmou que a produção deste ano alcançou 6 milhões de plantas, um recorde impulsionado pelo esforço dos agricultores para atender à demanda crescente — mesmo com margens de lucro cada vez menores.

Esculturas de Catrinas em um campo de flores de cempasúchil em San Luis Tlaxialtemalco, nos arredores da Cidade do México, sexta-feira, 17 de outubro de 2025. — Foto: AP/Claudia Rosel

Esculturas de Catrinas em um campo de flores de cempasúchil em San Luis Tlaxialtemalco, nos arredores da Cidade do México, sexta-feira, 17 de outubro de 2025. — Foto: AP/Claudia Rosel 

Um elo entre vivos e mortos 

O cempasúchil é muito mais do que uma flor: representa um elo simbólico entre o mundo dos vivos e o dos mortos. As pétalas intensamente alaranjadas são usadas para guiar as almas durante as celebrações e adornam ruas, cemitérios e altares em todo o país.

Além do valor espiritual, o cultivo movimenta cerca de R$ 14 milhões (US$ 2,7 mi) por ano, se tornando fonte de renda essencial para milhares de famílias rurais.

Flor Jimenez rega sua plantação de flores de cempasúchil em preparação para as celebrações do Dia dos Mortos em Xochimilco, onde se cultivam cravos-de-defunto nos arredores da Cidade do México. — Foto: AP/Claudia Rosel

Flor Jimenez rega sua plantação de flores de cempasúchil em preparação para as celebrações do Dia dos Mortos em Xochimilco, onde se cultivam cravos-de-defunto nos arredores da Cidade do México. — Foto: AP/Claudia Rosel 

A busca por soluções 

Diante da crise, cientistas do governo mexicano tentam salvar a tradição com tecnologia e resgate genético. Em um banco de sementes chamado Toxinachcal, pesquisadores armazenam milhares de variantes de plantas nativas, incluindo 20 tipos de cempasúchil, em câmaras frias. 

Segundo a bióloga Clara Soto Cortés, responsável pelo projeto, a substituição de variedades tradicionais por sementes híbridas — importadas dos Estados Unidos — agravou os prejuízos.

“As sementes nativas mexicanas são mais resistentes a secas e inundações, porque se adaptaram a diferentes geografias ao longo dos séculos”, explica. “As híbridas foram criadas para outro propósito, não possuem a diversidade genética necessária para enfrentar as mudanças climáticas.”

O plano é reintroduzir as variedades nativas em regiões mais afetadas, garantindo colheitas mais resistentes e protegendo o patrimônio agrícola mexicano.

Agricultor Jesus Cuaxospa trabalha em sua fazenda onde cultiva flores de cempasúchil em San Luis Tlaxialtemalco. — Foto: AP/Claudia Rosel

Agricultor Jesus Cuaxospa trabalha em sua fazenda onde cultiva flores de cempasúchil em San Luis Tlaxialtemalco. — Foto: AP/Claudia Rosel 

Luta pela sobrevivência 

Enquanto aguardam apoio governamental e soluções de longo prazo, agricultores como Ortíz e Carlos Jiménez, de 61 anos, tentam resistir. Jiménez afirma ter adotado as plantas híbridas há oito anos, mas agora considera investir em estufas para proteger o cultivo. 

“As plantas adoecem, apodrecem, e nosso negócio acaba. E com isso se vai nossa tradição, porque é a nossa economia”, lamenta.

Sem recursos para novas estruturas, muitos cortaram despesas básicas e buscam outras culturas que suportem melhor o calor e a umidade. Ainda assim, para a maioria, abandonar o cempasúchil não é uma opção.

“Esta planta tem um significado mais profundo para os nossos entes queridos que já se foram”, diz Jiménez. “São tradições que herdamos dos nossos antepassados. Elas não podem simplesmente desaparecer.”

Flor Jimenez embala flores de cempasúchil em sua fazenda, onde cultiva as calêndulas para as celebrações do Dia dos Mortos em Xochimilco — Foto: AP/Claudia Rosel

Flor Jimenez embala flores de cempasúchil em sua fazenda, onde cultiva as calêndulas para as celebrações do Dia dos Mortos em Xochimilco — Foto: AP/Claudia Rosel

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