Um adolescente de 17 anos que trabalhava em uma empresa de transporte no interior de Mato Grosso foi ameaçado de “levar um tiro pelo próprio empregador” ao manifestar a intenção de deixar o emprego. O caso terminou com a condenação da empresa ao pagamento de R$ 7 mil de indenização por dano moral, além de todas as verbas da rescisão do contrato.
O jovem trabalhou de janeiro a abril de 2025, inicialmente na função de serviços gerais e, posteriormente, como lavador de veículos. Segundo relato apresentado à Justiça, ele decidiu deixar o emprego devido a jornadas exaustivas, atrasos salariais e ofensas sofridas em grupo de WhatsApp. Ainda contou que, ao manifestar a intenção de sair, foi alvo de ameaças.
Como prova, o adolescente apresentou áudios enviados pelo aplicativo de mensagens, nos quais o empregador fez diversas intimidações. “O dia que ocê pedir as contas pra mim, cara, que ocê sair desse lavador, eu vou mandar um tiro no cê. Se ocê sai daí, tá bom?” e “Então ocê pensa duas vezes antes do cê pedir as contas. Loguinho ocê vai ficar num lugar melhor. Ocê tem fé? Eu tenho muita fé, cara”.
A empresa foi notificada, mas não compareceu à audiência nem apresentou defesa. Por isso, foi declarada revel e confessa, levando o juiz a presumir os fatos narrados pelo trabalhador como verdadeiros.
O magistrado destacou que a ameaça é ainda mais grave por atingir um adolescente, contrariando a legislação trabalhista e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que garante aos jovens direito à profissionalização e à proteção no trabalho. “Inquestionável que a ameaça à vida e/ou integridade física do adolescente, tão somente por pretender pedir demissão, mostra claramente que o empregador passava longe de velar pela decência pública e pela segurança do menor”, afirmou.
O juiz classificou a conduta como “repugnante e inaceitável”, típica de uma “cultura do faroeste”, em que conflitos são resolvidos “na bala”. “Isso não se amolda mais com o Estado Democrático de Direito e, muito menos, com o que espera e deseja a República Federativa do Brasil e o Estado de Mato Grosso”, enfatizou.
Segundo a decisão, além de ser incompatível com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho, a prática de ameaças descumpre compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, como a promoção de trabalho decente prevista na Agenda 2030 da ONU.
A Justiça também alterou a forma de encerramento do contrato, convertendo a demissão em rescisão indireta, já que a ameaça viciou a vontade do trabalhador. A empresa foi condenada a registrar a Carteira de Trabalho do jovem, pagar aviso prévio, férias e 13º proporcionais, FGTS com multa de 40%, além das penalidades por atraso na quitação das verbas rescisórias.