Despreparo. Sedentos para matar. Execução. Força extrema. As palavras são do professor e sociólogo Naldson Ramos, membro do Núcleo de Violência e Cidadania da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), usadas contra a ação da Gerência de Operações Especiais (GOE) que resultou em seis suspeitos do assalto à cooperativa Sicredi mortos em confronto policial.
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Entre os acusados, três têm passagens criminais por roubo à mão armada, tráfico de drogas, receptação, sequestro e cárcere privado. A identificação dos suspeitos foi realizada em conjunto com a Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec).
Os policiais foram de Cuiabá para Rondonópolis (distante 220km de Cuiabá) para ajudar na elucidação do latrocínio (roubo seguido de morte) contra o padre João Paulo Nolli, estrangulado por três menores.
Porém, na segunda-feira (10) ouve um assalto na agência do Sicredi, na qual sete acusados invadiram o terminal bancário, roubaram a arma do vigilante e o dinheiro do caixa. Os policiais civis que estavam na cidade começaram as buscas pelos suspeitos que foram encontrados em poucas horas.
Eles, sendo todos do município de Primavera do Leste (distante 230km de Cuiabá), estavam em uma casa, que foi usada como QG do crime, quando a polícia chegou.
Ao fazer o cerco na residência os policiais alegam que foram recebidos à balas, segundo o boletim de ocorrência registrado na Delegacia de Roubos e Furtos do município. Na troca de tiros, os policiais entraram na residência e conseguiram deter três pessoas, entre elas duas mulheres, e seis morreram na troca de tiros. Rapidamente, após os disparos cessarem, os ladrões foram colocados na caminhonete da própria polícia e levados para o hospital. Lá os médicos confirmaram a morte de todos.
Despreparados
O professor Naldson comentou que o crime em Rondonópolis sempre existiu, porém a crescente onda dos últimos dias se agravou devido o ato dos policiais que estavam na cidade para desvendar um crime e “cometeram” mais mortes.
“Começou com a morte de um padre, uma pessoa reconhecida na cidade, causa comoção na comunidade cristã e acabou refletindo nesses seis mortos. Não tenho dúvida que a morte do padre desencadeou o assassinato dos seis, pois os policiais saíram de Cuiabá para elucidar aquele crime e acabaram matando seis jovens, que naturalmente poderiam ser presos”, disse.
Após o caso, o Ministério Público Estadual (MPE) requisitou perícias e laudos de necropsia do confronto entre assaltantes e os policiais. O objetivo desse trabalho é comprovar a lisura no caso.
Para Naldson, o caso precisa ser investigado a fundo, pois tudo não passou de uma ação em que o governador Pedro Taques (PSDB) ordenou fazer. “Naturalmente esses casos precisam de maiores investimentos e investigação, pois os policiais receberam telefonema anônimo indicando onde estavam as pessoas. Poxa, era fácil você render todo mundo. Poderia cercar a casa, como foi feito, e prender todo mundo. Mas não, eles foram sedentos para executar. Com certeza a morte do Padre desencadeou em um telefonema para o governador e o governador mandou ir lá fazer o que ele acha que é bonito: matar as pessoas como uma forma de acabar com o crime”, falou o professor ao HiperNotícias.
O professor ainda contesta a forma da ação empregada na ocorrência e disse que só atira na cabeça com tamanha perícia atiradores de elite. “A forma que os tiros pegaram prova que foi tudo à queima roupa. A polícia quando vai, ela vai preparada de tudo. Com colete, armamento, capacete, arma de grosso calibre e preparada para o confronto. Ela não vai de peito aberto para poder levar tiro, tanto é que ninguém levou tiro. Já eles foram mortos à queima roupa com tiro na cabeça, peito, na boca. Ninguém acerta esse tiro a 30 metros, 20 metros. A não ser que seja atirador de elite. É necessário investigar a forma que o policial vai para agir nesses tipos de caso. Se ele vai para matar ou para prender”, pontuou.
“Criticar de longe é fácil”
A análise do professor da UFMT foi contestada pela gerência GOE, delegado Ramiro Mathias. Ele disse que criticar a polícia dentro de uma sala com ar-condicionado é fácil.
"Ele não estava no local e não sabe como estava os policiais naquela na ação. Nem eu, que estava em outra missão. Na minha concepção, meus homens agiram de forma legal. Eles são os mais capacitados do Estado e possuem curso de Operações Especiais. Eles foram recebidos a tiros e a reação de disparo é normal, pois tiveram que atirar para se defender”, frisou o delegado.
Mathias ainda confirma que aguarda as apurações do Ministério Público, mas de imediato rechaça qualquer tipo de fala que contenha as palavras excesso e execução. “Nenhum policial sai de casa para matar, muito menos é formado para isso. Nós revidamos os ataques de fúria dos criminosos. Entramos na casa sob disparos e tivemos que dar a resposta à altura. O excesso não existe quando agimos com profissionalismo. Só tivemos essa alternativa”, pontuou.
O gerente do GOE ainda reforça que se fosse uma ação de execução não haveriam vivos. “Ficou vivo uma adolescente, uma mulher e um rapaz que ainda está internado. Fomos para prender, mas tivemos que atuar com revide já que eles atiraram. Não fomos sedentos para matar ninguém. O policial num momento desse tem que ter extrema tranquilidade pois ele também têm uma vida a zelar. Eu não acredito em excesso e vamos aguardar todo tipo de investigação desse caso para mostrar a lisura do trabalho policial”, contestou o delegado.
Sesp
A Secretaria de Segurança Pública também se posicionou sobre o caso.
Os policiais do GOE são treinados para atuar em operações de alto risco, inclusive para identificar e responder de imediato, e com a força que se fizer necessária, a qualquer ameaça à integridade física de seus componentes e à sociedade.
"Em relação ao referido episódio, a Sesp não tem motivos para acreditar que a operação transcorreu de maneira diversa do estabelecido, mas aguarda a conclusão do procedimento aberto pela Polícia Judiciária Civil para apurar as circunstâncias da ação policial".
"A Secretaria repudia e considera irresponsáveis declarações que busquem relacionar o reforço da ação policial à situação política em Rondonópolis. Tais ilações não têm o menor fundamento, uma vez que ignoram a relevância econômica, demográfica e estratégica do município, que é polo de uma das mais importantes RISPs do Estado".
Resultado da ação
Foram mortos Douglas da Silva Nunes, 24, Kaique Leandro Oliveira Martins, 18, Thiago Rodrigues Soares, 21, Mateus Jones Back, 31, João Paulo Correa da Silva, 17, e Carlos Henrique Fontaneli Nascimento, 21.
O sétimo envolvido, Marcos Antônio Vieira de Oliveira, 20, ficou ferido e encontra-se internado no Hospital Regional de Rondonópolis. Ele segue em observação médica, sob escolta do Sistema Prisional, e vai responder em flagrante pelo homicídio tentado contra os policiais, porte ilegal de arma de fogo, associação criminosa, resistência à prisão, corrupção de menor e roubo majorado.
Duas mulheres, que estavam na residência, também vão responder por envolvimento na ação criminosa. Eliete Costa Cordeiro, 28, que no momento da ação policial estava de posse de quase R$ 3 mil, foi autuada em coautoria por associação criminosa majorada, corrupção de menores e roubo. Já a menor de idade, namorada de um acusado morto, J.A.C., 16, foi autuada em ato infracional.
Durante a ação policial, foram apreendidos duas armas fogo, cinco aparelhos celulares e a quantia de R$ 33.682,00 mil.